Traí, simplesmente -> Os textos de Dudú


Sim, no início morri de medo. Mas eu gostei. Traí porque o moço que me convidou pra jantar não usou a expressão "que tal meter um rango hoje à noite" e não fez qualquer menção ao Burger King. Pelo contrário, sabia exatamente como e onde me levar. Mesmo depois de tanto tempo, não negligencie o romance e o bom papo, ok? No meio do desgaste tem sempre alguém disposto a ajudar e fazer sua mulher de novo bonita, leve e única. Apesar dos quase trinta, ainda tenho fantasias e vontades que precisam ser atendidas. Sublinhe isso.

De repente eu vi uma oportunidade de escapar daquela atmosfera contínua e rançosa perto de você, que fazia eu cansar de mim mesma, e conhecer outros lugares, bocas, perfumes e também outras mulheres que dormiam profundamente dentro de mim. Optei por sonhar ao vivo e a cores, ser quem eu quiser. Com eles eu era sarcástica, risonha, esperta, sanguinária, alegre, sexy, moderna, livre ou manipuladora. Certas tardes, tudo ao mesmo tempo, no mesmo corpo, na mesma vida. Pela primeira vez quem ditava as regras era eu.

Você achar que foi por reles promiscuidade revela o que eu já sabia, você sabe nada sobre mim. Sou ligada na impulsão pelos meus prazeres. Traí para devolver a mim mesma o corpo que nasceu comigo e me foi roubado desde os primeiros anos de vida, como se eu fosse uma cachorrinha no cio que não podia escapar pelo portão sob o risco de regressar com uma matilha de filhotes.

Meninas também querem trepar, tome nota. E cadê sua mão de namorado esticada a me conduzir pelos caminhos que eu intuia a existência, mas eu não conseguia tatear, ouvir, lamber, gritar, abrir, interromper? Traí porque, ao invés de usar a intimidade que criamos para descobrir loucuras juntos, você a masturbava com piadas e ações escatológicas.

Também não foi por maldade ou esporte, mulher quando trai sempre tem uma razão coerente, embora eu não saiba exatamente qual é. Ausência de diálogo ou falta de atenção, carinhos, educação ou surpresas, tanto faz, já bastaria as vezes que você se esforçava sem medida pra me diminuir intelectualmente ou quando falhava ao esconder suas mentiras. Traí por birra, por vingança, por troco, por trocados.

No fundo sou boba, romântica e sonhadora e de vez em quando confundo determinada emoção com sentimento. Talvez por imaturidade, você pode me chamar de fraca ou eu até pode me encarar como um pouco fútil. Sim, eu podia ter me esforçado e resolver as coisas. Mas ninguém luta por aquilo que não deseja mais. Aqui entre nós, você nunca me perguntou sobre isso com medo de ter certeza da resposta.

Minhas traições não foram por falta de amor. Eu tenho amor. De amiga, de mãe, de irmã, de parceira ou qualquer tipo de compaixão que cultivo por qualquer ser respeitável nesse mundo. Me faltava um amor de homem. Não me cobre uma resposta coesa, sou mulher, ainda que tenha esquecido isso no vácuo entre você e eu. Por que não te larguei? Por medo de perder em ti a esperança de ter o homem que gostaria de ter. Confuso, mas como pode ver com seus próprios olhos cegos e fechados, álibis eu tenho de sobra.

Mas não se preocupe com a única coisa que realmente dá bola, que é sua reputação. Foi tudo um caso sem importância, sensações fugazes como se eu tivesse me enganchado na cauda de um cometa numa galáxia super distante. Não sei sustentar indefinições por muito tempo. E também sei que todos esses motivos não servem como desculpa, mas quem precisa se desculpar quando incomoda mais cárie do que culpa?

POR CRIS COLFER..
 16/01/11 01:38 AM

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