Alexia e as encruzilhadas da Avenida Brasil

Uma nova novela começou no horário nobre. Cheia de tramas, maldades, mal entendidos, crueldades, e desencontros. Uma protagonista determinada, uma antagonista idem, com alta dose de falta de caráter associada a uma falta de limites.
Mas por trás dos holofotes, quem me chamou a atenção foi Alexia, a personagem de Carolina Ferraz. Mulher independente, solteira, que vendo o relógio biológico marcar os quarenta e cinco do segundo tempo, resolve realizar o sonho de ser mãe fazendo uma produção independente. Até ai história semelhante à de muitas mulheres. A diferença está em dois detalhes inusitados: ela escolhe inadvertidamente para pai do seu filho um homem já bígamo; e segundo detalhe, se apaixona por ele, virando a terceira esposa desse Sheik de araque. Pior, descobre que já conhecia e era amiga de longa data de Verônica, uma das esposas de Cadinho. Que situação.... Grávida de um homem que parecia ser o cara, o pai ideal, que prometia mundos e fundos e no fundo, era uma grande mentira. O que fazer?
Ela, que ao contrario das outras duas, sabe da existência das outras famílias e, embora não concorde e tente dissuadi-lo da ideia, acaba por ajuda-lo a sair de grande parte das enrascadas em que se mete Cadinho. Se torna amiga, parceira, cúmplice nos planos para evitar que as outras mulheres descubram e encerrem os relacionamentos.
Alexia representa a diversidade do tempo moderno, onde a mulher tem que se adequar ao maremoto emocional da modernidade, e  inteligentemente evitar ser afogada pelas lagrimas da desilusão, sendo forcada a partilhar suas figuras masculinas. A despeito da hipocrisia social, dos casamentos de fachada, das pseudo fidelidades de quem ainda não está pronto para encarar a verdade.
Certamente haverá quem critique a sua atitude. Jesus já dizia que é muito mais fácil ver o cisco no olho do irmão que a trave que está no nosso próprio olho. Mas se observarmos bem a personagem, compreenderemos ao menos a sua lógica. Isso é amor? Se tornar cúmplice de um homem em suas armações para enganar outras mulheres? É a forma de amor de Alexia. É uma forma inteligente e desprendida de amor. Há os que dirão: É falsidade! Mas o que é real nesse mundo moderno, cada vez mais fake?
A bem da verdade, não foi ela que criou toda essa situação. Ela também foi vítima. Acabou se envolvendo num quadrilátero de relações amorosas. E quando descobriu, sua primeira reação foi contar a verdade e acabar com a farsa. Mas foi convencida a continuar pelo homem por quem estava apaixonada.
Na cena em que sua filha finge estar doente, ela recebe uma falsa mensagem do celular de Cadinho, na verdade enviada por uma das esposas dele, e pede que ele a encontre na farmácia. Tudo o que ela buscava naquele momento era ter o pai de sua filha ao seu lado em um momento difícil. Mas Noêmia vai ao encontro no lugar de Cadinho e descobrindo a farsa, a humilha, descarrega nela e não nele, a sua raiva por estar sendo traída. Culpa a ela, a outra mulher, a outra. Não o marido, o infiel. Alexia, ouve, cala e minimiza a relação com Cadinho, informando que só o conhece a um mês. Dando ao relacionamento, ares de casualidade, o que tornaria menor, aos olhos da esposa, o crime do seu marido/amante. Como julgar um caso desses?
A grande fragilidade do sexo feminino em relação ao masculino, não está na força de trabalho, na inteligência, na capacidade de exercer funções da mulher. A grande fragilidade do sexo feminino, está em não saber se aliar a outras mulheres. Mulheres são desunidas, competitivas entre si, de uma maneira diferente da dos homens. Homens não traem a "raça" (como se autodenominam) quando o assunto é relacionamentos. Quando um homem, vê outro em atitude suspeita de traição, pode ser seu próprio pai, normalmente não revelam à mulher traída. A menos que eles próprios, tenham interesse em conquistar a vítima da traição. Para os homens, amor é um departamento completamente distinto de sexo. Eis a diferença.
Ela é culpada, alguns dirão, pois sabia de tudo e continuou. Mas saber de tudo não seria também uma grande responsabilidade, ao invés de um trunfo? Ela poderia destruir tudo, derrubar o castelo de cartas dele, mas isso não tornaria nenhum dos envolvidos mais feliz. E afinal de contas, essa não seria uma tarefa dele? A fidelidade às esposas, é missão do marido, ou da amante que ele arranjou? Ora, a César o que é de César!
O grande culpado na história de Cadinho e suas três mulheres, é ele mesmo. É a sua incapacidade de limitar-se. De perceber que o seu direito finda, onde começa o do seu próximo. É a sua incapacidade de perceber que pode acabar ferindo, ou machucando alguém, com suas escolhas. Mas as mulheres se voltam contra Alexia. Que na verdade, de uma maneira distorcida, acaba tendo uma atitude até altruísta, ao passar por cima de seus sentimentos pelo bem da "coletividade". E o problema vai crescendo, por anos. Filhos sendo criados sem saber os irmãos que tem, relações sendo tecidas em torno de uma grande mentira. Famílias sendo montadas por um homem que não percebe que em dado momento não será capaz de manter toda essa estrutura que acabará por desmoronar e ferir muita gente. Seria cômico, se não fosse trágico. Casos como esse, ocorrem diuturnamente na vida real. E vidas acabam sendo destruídas pelos excessos, pelo ciúme, pela possessividade, pela ausência do perdão. Só quem já esteve em algum dos vértices desses triângulos, quadriláteros amorosos, sabe o quanto machuca ferir e ser ferido, enganar ou sentir-se enganado. Trair, ou sentir-se traído.
Não estou dizendo que o que a personagem Alexia decidiu fazer com a sua vida é o correto. Teoricamente, o correto é escolher alguém para amar e ser amado. Mas quem de nós pode apontar o outro e condená-lo sem conhecer toda a verdade. E dos quatro envolvidos principais nesse jogo (fora os filhos, vítimas consecutivas), o único que conhece a verdade menos parcial, seria o próprio Cadinho. Mas Cadinho é um personagem com tons de comédia, não de drama. E se nós mesmos, achamos as atitudes dele divertidas, se o enaltecemos como o pegador, o inteligente, o que dá conta de 3 mulheres, como condenar Alexia?
Nos dias de hoje, onde o sexo é fácil e o amor dificílimo. Num mundo onde as pessoas confundem a liberdade de amar, de escolher, de decidir com a libertinagem de trocar, enganar, iludir, ludibriar infinitamente, como conseguir tal proeza? Como julgar alguém que se esforça para preservar o único relacionamento que lhe coube? Julgar? Sempre muito difícil. Que possamos julgar, antes, as nossas próprias atitudes, que as dos outros!
Por Cris Vaccarezza

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