Pudor

"- Meninas tem que ter pudor! 
- Mas que atitude machista, papai! 
- Atitude machista nada?! Atitude machista é sair por aí, feito caça, atrás de caçador! Atitude machista é ter que tomar atitudes para forçar barras, por carência. Tá faltando macho. Claro! As fêmeas estão machos demais!"
Nem é que meninas têm que ter pudor. Acho que pessoas de modo geral tem que ter pudor. Pudor de se expor tão patética e precocemente em relações imaturas que desrespeitam seus corpos e violentam sua alma. Eu disse pessoas. Não apenas mulheres.
Não acho que mulher tenha que ser feminista, machista, sexista. Acho que mulher tem que ser feminina. Estamos deixando de ser.
Já passamos dessa era de conquistas pela força, pela imposição do poder. Vamos lá! Já estamos no século vinte e um. Não há mais espaço para queimarmos soutiens em praça publica. Já nos libertamos da opressão no grito. Conquistamos nosso espaço pela competência. Agora é hora de mantê-lo com inteligência, com graça. Não há porque sair se dando por ai indiscriminadamente, se deitando e se deixando usar como nos tempos dos coronéis, em nome de um prazer que ainda não conquistamos de verdade. Bom lembrar que a mulher não lida com a sexualidade como os homens. E isso é biológico, não é social. E não acho que sair por aí, tentando com vários ao mesmo tempo vá ajudar.
O problema é que em vez de ensinarmos aos homens, como queremos ter prazer, e que assim tenham mais prazer com nosso prazer, estamos deixando que nos tenham apenas como objetos de seu prazer. Eles se saciam. Nós não. Uma vez saciados de corpo, eles partem em busca de algo mais.
O que acontece é que saciedade sexual no homem, isoladamente e a longo prazo, causam tédio a ele. Na mulher, isso ocorre a curto prazo. Então, ele segue para outra, em busca de algo especial que lhe complete mais que o corpo. Sem se dar tempo de conhecer aquela em especial. Enquanto ela, por falta de tempo de se dar a conhecer, acaba tendo que buscar mais um, o próximo, porque o que jaz agora ali na cama, é mais um que não soube conquistar a sua intimidade a ponto de lhe dar o verdadeiro prazer.
Seguem então, homens e mulheres, incompletos, rumo a um ideal inatingível. Em busca da perfeição , em vez do conhecimento. Correndo atras do pote de ouro no fim do arco irisa. Jamais chegarão. Um dia, cansados de tanta busca e tropeço, acabam casando com o primeiro que parece menos errado, e se divorciam em seguida por perceber que ainda não encontraram o que buscavam.
E isso não tem nada a ver com machismo e feminismo. Tem a ver com pressa, disputa boba de poder, jogo fálico. Infantilidade emocional.
Cada vez mais homens e mulheres têm casa, carro, beleza, tempo, saúde, independência financeira mas não têm com quem partilhar. Podem ir a todo os lugares, mas nao têm com quem. Não têm a quem dedicar seus dias. Têm tudo, mas não são felizes. Tudo isso por não se darem tempo para se conhecer, se cativarem, se tornarem íntimos antes de terem qualquer intimidade. A modernidade aboliu as regras, mas viver sem método é impossível. Gera o caos. É o que estamos vivenciado. Nada contra o sexo. Tudo contra a falta de pudor. É preciso que as pessoas conquistem as vergonhas do outro, antes de penetrá-las. É preciso dar-se tempo de derrubar o pudor com palavras, gestos, atitudes. Substitui-lo por afeto, confiança, parceria.
Assim teremos relações muito mais prazerosas, pois tudo aquilo que se faz com intimidade tem um sabor diferenciado. Assim como toda fruta, provada no tempo certo, não tem gosto de verde nem devês. Tem o doce da fruta plena de prazer. O doce que todos buscam de maneira errada.
Por Cris Vaccarezza

1 comentários :

Andréa Mercês disse...

Concordo em gênero,número e grau,Cris!!! muito lúcido seu ensaio!!! Tenho visto tb como as pessoas têm se deixado tornar-se "coisa"...não julgo,apenas entendo que é esta a razão de tanta solidão e tantos desencontros...

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