Diferente,entre iguais

Era uma vez uma menina, que viva no alto de uma torre. Mãozinhas nas grades da janela, assistia curiosa, a vida no térreo, do lado de fora. Adoraria receber flores, qualquer tipo de flores. Rosas, azaleias, jasmins. Qualquer coisa que perfumasse sua alma. Mas a vida, ultimamente, parece que só lhe enviava espinhos.
Mesmo assim, os abraçava. São os espinhos que engrossam os pés. São os espinhos que nos empurram pra frente. São os espinhos que nos fazem caminhar.
Ainda entre os espinhos, não deixou de observar o perfume das rosas que as outras meninas, as bonitas, recebiam. E chegavam até ela lá em cima, mesmo por entre as grades da janela.
Bonita como eram as outras, ela não podia ser. Para ser protegida da vida, fora, desde cedo, trancada na torre. Entre os espinhos.
Na torre não havia um espelho sequer. Só podia ver o belo, nas outras, que via do alto da torre, através das grades e espinhos, à distancia. E à distancia, todos são belos.
Do alto da torre, não ouvia maledicência. Não conhecia a inveja. Do alto da torre, não conhecia o dinheiro. Estava distante do mal. Só via a beleza em todos os que passavam. O sol que nascia e se punha. Só via a lua se mostrar diferente a cada dia. Diferente, como era ela mesma. Do alto da torre só via a Deus, estava mais pertinho do céu.
Se alguém olhasse para cima, se alguém prestasse atenção, talvez notassem a menina, talvez lhe dessem razão. Mas a vida seguia lá embaixo, e a menina, trancada, seguia no alto, na solidão.
Um dia, foi libertada, de um jeito diferente: Pelo tempo... Acabada a sua pena, enfim, pode sair. Não foi libertada por nenhum príncipe. Cumpriu sua pena até o final.
Que príncipe deixaria as belas, já familiares, para escalar a torre, lutar contra os espinhos e libertar a menina que ninguém via? Que ninguém igualmente sabia se era bela? Nenhum! E nenhum apareceu.
Finda a pena. Protegida da vida, desceu, com suas roupas em frangalhos, para a aridez da rua e a luminosidade do sol. As pessoas apontavam para ela e riam. Que coisa horrenda aquela mulher desgrenhada, aquela mulher em frangalhos, vestida como uma louca, com os cabelos emaranhados? Como ousava, descer assim para a rua? Como ousava exibir-se assim tão desleixada? Será que não tinha um espelho em casa?
Não, não tinha espelho. Pior. Não tinha casa.
Mas àquela menina, nem o escárnio importava. Estava livre, afinal. Da torre, da casa, dos espinhos... Podia enfim, apanhar uma flor, colocar nos cabelos desgrenhados e caminhar pelas ruas feliz, lindamente vestida em andrajos! Pés no chão, cabeça nas alturas em que sempre vivera. Jamais seria uma igual.
Todos a apontaram. Poucos se apiedaram. Nenhum ofereceu ajuda. Ela nem ligou. Seguiu, caminhando em direção ao sol.
-É uma louca! - Gritaram. Eles nem sabiam o quanto...
Por Cris Vaccarezza

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