Amanhecia mais um dia vazio, com os mesmos sintomas: Olhos
cheios de lágrimas indecisas entre rolar ou não; o peito oprimido por uma
lâmina fincada apenas no sentimento.
O estômago, permanentemente cheio de dor de uma dor
imaterial. Apetite nenhum. Vez em quando, um sacudir negativamente a cabeça,
como que tentasse espantar lembranças doces e venenosas. Uma tragédia
anunciada, apenas postergada, apenas procrastinada.
Até que enfim, a desilusão bate à porta, cobrando o alto
preço das ilusões vencidas, das promessas não pagas. É preciso abrir! Por que
demorou tanto?
Eis que enfim, vejo meu rosto envelhecido em frente ao
espelho, de tanto esperar por nada. Os olhos fundos das noites perdidas num
aguardar em silêncio.
A mão que agora se estende em direção à fechadura, tampouco
é a mão que vi balançando no ar em um vago adeus, quando você partiu. Naquele
tempo, cria que a força desse amor te traria de volta. Mas não! A vida te
tragou para os seus seios fartos. E você, se deixou levar.
Como culpa-lo? Se foram essas mesmas mãos, outrora jovens,
que se abriram e te deixaram voar pela certeza de saber-te livre? Mas na
esperança que o amor o fizesse ficar. Agora cansadas, envelhecidas, giram a
maçaneta e deixam entrar as cobranças do tempo. Se há lagrimas, que comecem a
rolar. Se há inapetência, que os quilos sigam porta a fora, junto com os
sonhos. Já prolonguei demais meu outono.
Em verdade, foram muitas as estações travestidas de outono.
Em meu mimetismo, praticamente gastei a vida, colando as folhas uma a uma, para
que ficassem, Mas elas se foram. Um dia estiveram no alto das copas, agora
recobrem o chão esperando a neve. É um ciclo. Em breve, brotarão da terra em
verde novo, quando a primavera chegar. Tudo se renova.
Mas já que o inverno chegou, deixe os credores gelados da
desilusão entrar. Que tomem um café comigo! Que se sintam em casa e me façam
companhia no inverno de minha vida, que se inicia agora. Deixa que fiquem.
Aqueçamo-nos!
Tudo passa... Assim como já houve sol, assim como um dia fez
calor (custe o tempo que custar, lá na frente), há de vir uma primavera. Então,
saciados, os credores partirão e meu coração, estará finalmente em paz.
Por Cris Vaccarezza
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